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ONGs irregulares prejudicam trabalho de entidades sérias

sexta-feira, 16 de setembro de 2011


Centro Burnier - A diretora Executiva da Associação Brasileira de ONGs (Abong), Vera Marzagão Ribeiro, 52 anos, doutora em Educação, se reuniu na última segunda-feira, 12 de setembro, com entidades ambientais e sociais de Mato Grosso, na sede do Fórum Matogrossense de Meio Ambiente e Desenvolvimento (Formad). A Abong busca se reestruturar no Centro Oeste onde já teve escritório e hoje não tem mais, embora tenha entidades daqui filiadas. Ela coordena a ONG paulista Ação Educativa e tem uma visão interessante sobre o papel das organizações não governamentais. Ela reconhece que os desvios de verbas praticados por algumas entidades duvidosas colocam em risco trabalhos muito importantes, desenvolvidos por entidades seríssimas. Para resolver isso: transparência! Leia a entrevista.

Quando surgiu essa ideia de ONGs no Brasil?
A organização da sociedade quase que sempre existiu, pessoas que voluntariamente se articulam para se apoiar ou para refletir ou para influir em algo que lhes interessa transformar ou criar na sociedade. Mas com essa clara orientação de um grupo de pessoas que quer influir nas políticas públicas numa certa direção isso é relativamente novo. Estamos comemorando agora os 20 anos da RIO 92, que foi um momento importante quando as ONGs que pretendem um modelo de desenvolvimento mais justo e sustentável apareceram para a opinião pública.

Qual é o papel central de uma ONG?
A ONG é um conjunto de pessoas que se reúne em torno de uma missão comum, geralmente elas partilham visões comuns e vislumbram um certo projeto de sociedade que querem construir ou alguns problemas sociais que querem transformar. Isso no campo de ONGs que a Abong representa, porque há também muitas ONGs num campo mais amplo de organizações não-governamentais que inclui várias entidades, por exemplo, uma creche comunitária, um asilo de uma entidade religiosa, um clube recreativo. Todas são organizações não governamentais, mas as que a Abong representa são formadas por pessoas que querem participar da política não através de partidos ou entrando diretamente no governo, mas como sociedade civil, entendo que um governo democrático tem que ouvir a sociedade civil organizada.

Quantas ONGs existem hoje no Brasil e quantas são filiadas à Abong?
O IBGE contou 338 mil, mas isso inclui um universo muito diverso de clubes, associações, hospitais, escolas filantrópicas, mas esse campo, que eu digo que é um campo mais próprio da Abong e já está até na legislação brasileira como organizações de defesa de direitos, são 6 mil, um número bem menor. Filiadas à Abong são cerca de 250, mas tenderia a dizer que as mais fortes, mais influentes, as que mais realizaram conquistas em termos de direitos, de democracia no Brasil, são filiadas à Abong.

Quais são as principais bandeiras da Abong?
O marco regulatório é uma, fortalecer nossas associadas em algumas questões que a gente considera chave, por exemplo a questão da gestão e da comunicação. Gestão porque a sociedade precisa confiar na organização, de que os recursos que ela conseguir captar terão melhor uso possível, de onde vem os recursos, quanto vem do Estado ou é de uma agência, ou é de uma igreja, ou de que tipo de pessoa, quantas pessoas doam...Transparência é uma linha em que a Abong vem trabalhando. E a comunicação. No mundo complexo em que a gente vive, é impossível fazer política no sentido de interferir nos rumos da sociedade, influenciar políticas públicas sem fazer comunicação, uma atividade fundamental.

Qual a principal fonte de financiamento das ONGs no Brasil?
A Abong reúne um conjunto de organizações que teve origem muitas delas ainda no tempo da ditadura militar quando a única fonte possível para fazer crítica ao governo eram os recursos internacionais. Então grande parte das organizações da Abong tiveram uma base forte de financiamento internacional que vem diminuindo, no entanto 80% dos filiados ainda mantêm algum tipo de vínculo com agências internacionais. Eu considero que isso é um patrimônio que a gente de fato não deve jogar fora, porque a gente sabe também que hoje em dia as grandes lutas sociais e ambientais são internacionais, então se a gente tem uma história de trabalho conjunto e de solidariedade e confiança com agências europeias e norte-americanas a gente tem que fortalecer esse vínculo que a gente chama de movimentos de cidadania planetária. A gente espera que a conferência RIO + 20 seja um grande momento para reafirmar isso. O Fórum Social mundial, há mais de 10 anos, também vem fortalecendo essa pauta de unir o pessoal, os defensores dos Direitos Humanos, do bem viver nas diversas partes do mundo, para firmar uma nova visão, uma nova perspectiva, um novo projeto de desenvolvimento para o planeta. Hoje o problema das mudanças climáticas mostra que temos que agir e pensar no local e no global, porque temos problemas que afetam a todos nós, aqui no Brasil ou na Patagônia.

Os governos também investem em ONGs?
Esse governo aposta. A Abong, junto com outras organizações da sociedade civil, de outras linhas, mais ligadas à igreja e a investimentos do capital privado, articula uma plataforma com uma série de reivindicações para que o governo estabeleça política e crie um marco legal que facilite a vida dessas organizações que a cada dia têm tido mais dificuldade de sobreviver, porque, além da redução dos recursos internacionais, é instável o acesso a recursos públicos e mesmo de captação junto à população, porque se gerou uma visão que as ONGs são fonte fácil para desviar recursos e um bom negócio para enriquecer, essa é uma visão totalmente errônea. As pesquisas da Abong estão mostrando que de fato as entidades passam por extremas dificuldades, nesse momento em que diminuiu a presença de recursos internacionais, passamos oito anos do governo Lula tentando isso, já que a gente tinha muita esperança de que seria um novo cenário político favorável às organizações, não foi o que a gente encontrou, foi muito difícil o governo se abrir porque de fato a organização autônoma é sempre questionadora e assim é que tem que ser. Mas tenho fé que tem setores dentro do governo que são sensíveis e acreditam que a democracia se constrói não só com gente boa dentro do governo, mas também com uma sociedade forte, organizada, combativa. Com tantas organizações sérias com dificuldades para continuar existindo, tem também organizações fantasmas, que, infelizmente, contam com o apoio de alguns setores do governo, como uma válvula para vasar dinheiro público para atender interesses políticos, quando não interesses particulares.

Como está a organização da Abong em termos de Brasil e Centro Oeste?
A gente tem essa filosofia da descentralização e da participação e a base dela são os regionais, que são oito. E tem uma coordenação nacional que articula essas regionais todas. A gente já teve um escritório regional Centro Oeste e que por fatalidades e caminhos das próprias organizações se dissolveu, mas nós temos várias associadas aqui na região e em Mato Grosso. A Abong está tentando buscar formas inovadoras alternativas de trabalho. Uma delas são grupos de trabalho temático, como marco regulatório, África-Brasil, Rio + 20, comunicação, entre outras.

Como fazem as entidades que quiserem se filiar à Abong?
A Abong articula entidades que comungam os mesmos princípios antiracistas, antisexistas, trabalhar na perspectiva dos direitos e dos bens comuns, mas é aberta, porém tem certos critérios, como dois anos de atividade comprovada, para a gente saber ao que vem essa entidade. Precisa também ser indicada por outras duas entidades já associadas e ter CNPJ, embora não precisa ter orçamento.

Um comentário

  1. CONAMAs REGIONAIS - ENTENDA A PROPOSTA


    É inegável que o Conselho Nacional do Meio Ambiente – criado há mais de três décadas - precisa de uma reformulação voltada a sua adequação a atual realidade ambiental do Brasil.

    Hoje, com mais de 100 conselheiros, pode ser comparado (por força de expressão) a um “Maracanã Ambiental” que lotado dificulta muita as vezes o processo das deliberações.

    Por exemplo, muitas das decisões são tomadas segundo uma visão centralizada – a partir dos olhos de Brasília – mas que poderiam ser melhor deliberadas se o fossem diretamente nas regiões (Biomas) onde os problemas ocorrem e, sobretudo, pelas pessoas / entidades que (efetivamente) vivem o problema. Ou seja, por exemplo, conselheiros das Regiões Sul e Sudeste do Brasil deliberando sobre assuntos ligadas a Caatinga.

    Deste modo, é inadiável que se promova uma AMPLIAÇÃO das atividades do CONAMA, ou seja, um processo de REESTRUTURAÇÃO que possa assegurar mais eficácia ao CONAMA, sem retirar dele a importância que tem no cenário ambiental nacional.

    A proposta é a da criação dos CONAMAS REGIONAIS POR BIOMAS onde os temas específicos de cada Bioma
    possam ser levados a discussão nas regiões onde ocorrem, envolvendo quem conhece a problemática regional.

    Um Bioma é um conjunto de tipos de vegetação que abrange grande áreas contínuas, em escala regional. Que apresenta flora e fauna similares, definida pelas condições físicas predominantes nas regiões. Esses aspectos climáticos, geográficos e litológicos (das rochas), por exemplo, fazem com que uma Bioma seja dotado de uma diversidade biológica singular e própria. No Brasil, por ordem decrescente de tamanho, os Biomas existentes são: Amazônia, Cerrado, Mata Atlântica, Caatinga, Pampa e o Pantanal

    Ao CONAMA caberia manter as discussões e deliberações dos macro temas ambientais (que envolvem dois ou mais Biomas), enquanto aos CONAMAS REGIONAIS caberia, para cada Bioma, o debate e deliberação de temas ligados a tais regiões específicas.

    A criação dos CONAMAS REGIONAIS levaria a seus plenários entidades hoje fora do CONAMA (produto da superlotação) que estariam ligadas a região específica para a qual se pretende uma intervenção ambiental. Um espaço significativo para entidades ambientalistas locais e regionais que dariam uma grande dinamização dos trabalhos.

    Não é novidade a criação de Conselhos Regionais no Brasil; o Estado do Espírito Santo já descentralizou seu Conselho Estadual de Meio Ambiente há mais de 10 anos e, alguns anos depois, de forma própria, o Estado de Mina Gerais evoluiu no memso sentido.
    Portanto, a proposta de criação dos CONAMAS REGIONAIS não é uma novidade a ser testada; é uma experiência muito bem vivenciada que poderá ser adequada ao CONAMA.

    Roosevelt S. Fernandes, M. Sc.
    Conselheiro do Conselho Estadual de Meio Ambiente do Estado do Espírito Santo / CONSEMA – ES
    Coordenador do Núcleo de Estudos em Percepção Ambiental e Social / NEPAS
    roosevelt@ebrnet.com.br



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