A Assembleia Legislativa aprovou, em segunda votação, nesta quarta-feira (27), o Projeto de Lei do Zoneamento Socioeconômico e Ecológico de Mato Grosso (ZSEE) com apenas um voto contrário, do deputado estadual Ságuas Moraes.
A proposta da bancada ruralista apresentada pelo deputado estadual Dilceu Dal Bosco estava parada desde março na Comissão de Constituição, Justiça e Redação (CCJR), após ser aprovada em primeira votação pelo plenário.
Nesta semana, Dal Bosco foi nomeado relator do projeto na Comissão, ou seja, coube ao deputado dizer se o projeto criado e apresentado por ele mesmo era constitucional ou não. Isso aconteceu na tarde desta terça-feira, após colher as assinaturas necessárias para a aprovação na Comissão. Em menos de 24 horas, os deputados estaduais declararam constitucional e aprovaram o ZSEE.
O processo de aprovação em segunda votação na Assembleia foi caracterizado pela falta de transparência, repetindo a fórmula utilizada na primeira votação, já que houve emendas à proposta que até o momento são desconhecidas pela sociedade.
A proposta aprovada foi intitulada ‘Mapa dos Pesadelos’ por vários movimentos da sociedade civil organizada, por conter inúmeros e graves problemas de ordem técnica e procedimental. O ZSEE aprovado pelos deputados não considera os estudos científicos que embasaram a proposta original do executivo, desconsidera a diversidade das contribuições da sociedade mato-grossense colhidas durante as audiências públicas realizadas no estado, e atropela as normas regimentais que devem ser obedecidas para aprovação deste tipo de projeto, principalmente na questão da transparência e lisura.
Análise do Instituto Centro de Vida (ICV) comparou o substitutivo 1, apresentado pelo deputado estadual Alexandre Cesar, que contemplava as contribuições da sociedade e respeitava as questões técnicas e científicas, com a proposta recém-aprovada. Entre vários problemas detectados, estão as mudanças drásticas na composição do mapa do ZSEE (ver tabela abaixo):
- A Categoria 1, voltada à intensificação das atividades agropecuárias, avançou indiscriminadamente sobre áreas que apresentam alguma restrição ambiental, passando de 23 milhões de hectares no Substitutivo 1 para 39 milhões de hectares no Substitutivo 3, um acréscimo de 67%;
- A Categoria 2, que compreende áreas de relevância ecológica e paisagística, devido às suas características físicas, de sazonalidade do regime fluvial, de rica cobertura florestal e de proteção dos recursos hídricos, sofreu redução 26%;
- A Categoria 3, que abriga as Áreas Protegidas existentes e propostas, que compreendem Terras Indígenas, Quilombolas e Unidades de Conservação, sofreu redução de 20%. Dentro dessa categoria, as Áreas Protegidas Propostas, ou seja, novas Unidades de Conservação a serem criadas, foram reduzidas em 73%, passando de 5,5 para apenas 1,5 milhão de hectares.
Alterações em área e porcentagem nas três categorias do ZSEE entre os Substitutivos 1 e 3
Categorias | Substitutivo 1 (milhões de hectares) | Substitutivo 2 (milhões de hectares) | Expansão ou diminuição (milhões de hectares) | Expansão ou diminuição em percentual |
1 | 23,2 | 38,8 | + 15,6 | + 67% |
2 | 42,6 | 31,6 | - 11,0 | - 26% |
3 | 24,1 | 19,7 | - 4,4 | - 18% |
Fonte: Análise ICV
A proposta aprovada pode ser considerada um ‘tiro no pé’ dos ruralistas, pois para garantir a competitividade agropecuária de Mato Grosso é necessário também garantir a credibilidade das políticas ambientais do estado e, a médio longo prazo, a manutenção dos serviços ecossistêmicos que são gerados, em boa parte, pelas áreas das Categorias 2 e 3. Quanto à regularização ambiental das propriedades rurais do estado, uma das metas declaradas do setor, ela necessita da ampliação da área de Unidades de Conservação para viabilizar a compensação dos passivos de reserva legal.
Este zoneamento também contradiz as políticas nacionais e estaduais de meio ambiente e os compromissos assumidos perante a comunidade internacional, que preveem a redução do desmatamento e a promoção da agricultura de baixas emissões de carbono.
Além disso, pelas falhas e inconsistências apresentadas, o Zoneamento aprovado pelos deputados mato-grossenses corre o risco de não passar pela Comissão Nacional de Zoneamento e pelo Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama). Caso isso ocorra, o processo de construção dessa importante ferramenta de ordenamento territorial voltará à estaca zero.
Agora, a proposta segue para o governo do estado, que pode sancionar ou vetar o projeto.
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