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Produtos da floresta serão comercializados por meio de cooperativa de povos indígenas e extrativistas

quinta-feira, 5 de junho de 2014

Uma experiência inédita promete minimizar o principal gargalo da produção extrativista do Noroeste de Mato Grosso e Sudeste de Rondônia. Foi aprovada em assembleia a criação de uma cooperativa para comercialização de castanha-do-Brasil e outros produtos florestais não-madeireiros, formada por povos indígenas, extrativistas e pelo projeto Pacto das Águas, desenvolvido com patrocínio da Petrobras por meio do Programa Petrobras Socioambiental.

A criação da cooperativa foi discutida no Seminário de Intercâmbio de Experiências, realizado na semana passada em Ji-Paraná (RO), onde os grupos que fazem parte do projeto discutiram sobre as próximas etapas do projeto. Plácido Costa, coordenador do Pacto das Águas, demonstrou o quanto a qualidade da produção da castanha-do-Brasil vem atraindo cada vez mais um mercado disposto a pagar um preço justo pela amêndoa.

“Desde que o projeto Pacto das Águas começou a apoiar os povos da floresta, há cerca de dez anos, já foram produzidas aproximadamente 2 mil toneladas de castanha, o que gerou uma renda estimada aos indígenas e extrativistas de cerca de 5 milhões de reais”, aponta. “A qualidade da castanha vem atraindo novos grupos interessados em participar do projeto, tanto é que 10% dessa produção, ou seja, cerca de 500 toneladas, foram produzidas apenas nessa última safra”, explica.

Nesta nova etapa do Pacto das Águas, que teve início em dezembro do ano passado, continuam participando a Resex Guariba-Roosevelt e os povos indígenas Zoró e Rikbaktsa. Além destes grupos, integram o projeto os povos indígenas Arara e Gavião da Terra Indígena Igarapé Lourdes, em Rondônia e os Cinta Larga de Juína, em Mato Grosso.

O Pacto das Águas atualmente apoia a produção de castanha-do-Brasil, seringa e de outros produtos, em menor escala, como o artesanato indígena, em cinco Terras Indígenas e da Reserva Extrativista Guariba-Roosevelt, no Noroeste de Mato Grosso. O apoio se dá por meio de assessorias para gestão no manejo e comercialização, capacitações técnicas, intercâmbios, apoio na logística e infraestrutura das comunidades, como a construção ou reforma de barracões e entrepostos, além de mesa de secagem. É exatamente a comercialização desses produtos que muitas vezes se constitui num entrave diante das exigências do mercado.

Um dos entraves é o fato dessas comunidades serem representadas por meio de associações, que tem um cunho social e não comercial, muitas vezes impedindo uma negociação em larga escala por não possuírem inscrição estadual e não poderem emitir nota fiscal aos possíveis compradores. Em outros casos, uma associação, como é o caso da Associação dos Moradores da Resex Guariba-Roosevelt (Amorarr), nem sempre consegue preparar a documentação exigida em tempo para concluir uma negociação, devido à distância da área urbana e falta de estrutura, como telefone e internet, na comunidade.

Josias Cebirop, representante do povo indígena Gavião, explica que sua comunidade tem a visão de que é preciso encontrar saídas para facilitar o acesso ao mercado. “Muitas vezes, nossa produção não tem escala porque não encontramos meios legais para comercialização”, desabafa. “Acredito que nós temos o potencial para criar a cooperativa para dar lucro”, finaliza. Zinho Cinta Larga também acredita no potencial da cooperativa. “Nós pensamos em fazer uma cooperativa do povo Cinta Larga, mas não deu certo”.
O representante da Funai no seminário, Gilberto Bueno, chefe da CTL de Ji-Paraná, acredita que esse é o caminho. “Nós já vimos muitas associações serem criadas em terras indígenas e não funcionarem por serem ‘empurradas’ para as comunidades, mas desta vez a demanda está surgindo das próprias aldeias e é uma necessidade dos povos que almejam estar dentro do mercado formal”, analisa.
Bueno explica também que a Funai, por meio da Coordenação Geral de Promoção do Etnodesenvolvimento (CGETNO) vem promovendo debates com vários povos indígenas onde foi identificada a necessidade de estabelecimento de parcerias para melhorar a qualidade da produção e acesso aos mercados.

A criação da cooperativa foi aprovada durante o seminário, mas ainda precisa ser discutida dentro de cada aldeia e na Resex-Guariba-Roosevelt para ser formalizada. “Vamos levar a proposta da cooperativa para a comunidade pois acreditamos que é um bom desafio para nos fortalecer”, explica Ailton Pereira dos Santos, professor e presidente da Amorarr, da Resex.

A meta é que ainda em junho os povos respondam à proposta da criação da cooperativa para que ela já possa operar no início da próxima safra de castanha, no final deste ano.

Mercado
A comercialização em larga escala é uma alternativa para os povos da floresta pois permite a busca de grandes compradores que operam no chamado “mercado justo”. Ou seja, parceiros empresariais que estão dispostos a pagar um valor maior por um produto de qualidade e orgânico comercializados diretamente por essas comunidades indígenas e extrativista.

Sem essa formalização legal, os extrativistas muitas vezes não conseguem vender a sua produção a um preço justo, que dependendo da qualidade da castanha em casca chega a ser vendida entre três e quatro reais o quilo.

Outra vantagem da formação da cooperativa é a possibilidade de acessarem editais como os do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), da Companhia Nacional do Abastecimento (Conab), para formação de estoque, que na prática funciona como um empréstimo para capital de giro com juros de 3% ao ano. Acessando esse recurso, a cooperativa poderá pagar à vista a produção de seus cooperados, podendo optar em armazenar o produto até um momento mais favorável para a comercialização.

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